“Todos os dias do aflito são maus, mas o coração contente vive um banquete contínuo” (Provérbios 15.15)
Vencer as tarefas diárias requer energia renovada e o cotidiano competitivo é exaustivo, com pouco descanso, muitas horas de estudo, excesso de trabalho etc. O cansaço acumulado deixa pouco espaço para questionamentos efetivos de vida, sempre adiados pela convicção de que as coisas se resolvam amanhã, talvez! O advento da pandemia impôs a todos a dura ruptura da rotina, trazendo isolamento compulsório e prolongado, obrigando cada um a lidar com suas perdas, luto, óbitos em crescente estatística diária e a falta de perspectiva desta pandemia terminar impactou a todos de maneira diferente.
O corpo é afetado por difíceis sequelas da Covid-19 e seus múltiplos sintomas ainda não totalmente mapeados. A alma sofre por não conseguir organizar seus dias e a rotina antes previsível agora se vê impactada por mudanças profundas, pelo distanciamento de quem queríamos que estivesse por perto, falta de perspectivas e o emocional oscila ao confrontar sua própria falta de propósitos. O espírito quebranta com novas formas de culto e comunhão, dificultadas pela falta de domínio/acesso a ferramentas tecnológicas, que viabilizam contato sem substituir abraços e afetos.
Estatísticas globais registram aumento do estresse, depressão, tristeza profunda, perda de interesse, ausência de ânimo, oscilações de humor e inúmeros fatores sobre a saúde das pessoas. O ser humano, dotado de excepcional capacidade de adaptação, lidou de diferentes maneiras frente à nova realidade. Na primeira oportunidade muitos reassumiram rapidamente suas rotinas e prioridades enquanto outros foram dominados pela inércia e até passaram a preferir o culto online sem as responsabilidades do ministério presencial, do estudo virtual sem precisar vivenciar a dinâmica da sala de aula, do home office etc.
Talvez haja similaridade ao antigo estudo da síndrome do sapo fervido, atribuído a biólogos que provaram que um sapo jogado em água fervendo salta imediatamente para fora, meio chamuscado, porém, vivo. Por outro lado, se um sapo é colocado num recipiente com a mesma água de sua lagoa e o aquecimento da temperatura da água for gradual, ele fica estático durante todo o tempo, até que ela ferva. O sapo não reage ao gradual aumento de calor e morre sem conseguir sair da água fervente.
O sociólogo Corey Keyes cunhou o neologismo “languishing”, termo que foi descrito pelo psicólogo organizacional Adam Grant no jornal The New York Times, como sendo um estado emocional que, em sua essência, se define pelo vazio. É quase que um limbo emocional, reconhece Thaís Gameiro, doutora em neurociência pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e sócia-fundadora da Nêmesis, empresa de consultoria corporativa em neurociência organizacional.
É preciso observar se o marasmo na inércia está minando o potencial de realizações que jazem esquecidas, motivações engavetadas, tornando o que era vida em morte, nem alegria, nem tristeza, nem bem-estar, nem depressão. O ‘languishing’ não está nem de um lado e nem do outro. Fica no meio do caminho. Ainda assim, não é neutro e está longe de ser positivo. Um viver morno cozinhando o sapo que julga estar na melhor posição até que não restam mais forças para reagir. Um passo só na direção do Deus conosco. Deus das potencialidades, do recomeço, dos sonhos a realizar. Deus da eternidade e do presente.
Muitos estão curtindo seu recipiente sem perceber que a água está aquecendo. Enquanto outros voltam a sua rotina, o gostoso quentinho da água fervente faz muitos estarem inertes a vida, talvez permanecendo no escuro por falta de clareza em seus propósitos.