Em Israel nos tempos do rei Jorão, os leprosos eram deixados fora dos muros das cidades. Os locais onde eles viviam com outros leprosos era considerado um local impuro e caso se aproximassem de uma pessoa pura na estrada, eles eram apedrejados para se manterem distantes e não contaminar os outros.
O contexto dessa época era de guerra, fome e caos. E isso não era diferente entre os leprosos, pois eles faziam parte desse contexto social, mesmo fora dos muros, mesmo estando segregados.
Samaria estava sitiada e o povo passando fome. Eles não tinham solução para o problema por mais capazes que fossem. A solução desse problema não poderia ser resolvida pelo rei nem por seu exército.
Aconteceu, no entanto algo inusitado, o profeta Eliseu profetizou que em pouco tempo teriam alimentos com fartura, o rei ouviu em silêncio, mas, seu capitão duvidou e zombou do profeta, o qual disse-lhe que ele veria os alimentos, mas, não os comeria (2Rs 7.1-2).
Paralelamente a isso, Deus estava agindo e confundiu o exército da Síria, o qual ouviu um alarido de carros e cavalos de guerra que supostamente se levantavam contra eles. Com medo, fugiram deixando tudo no arraial, bens, alimentos e animais (2Rs 7.6-7).
Nesse ínterim, quatro leprosos começaram a fazer conjecturas sobre a situação em que viviam, e chegaram à conclusão de que morreriam qualquer que fosse a situação. Se ficassem ali, morreriam de fome, se fossem ao arraial dos sírios em busca de alimento, poderiam ser mortos, mas, diante da lepra, nada poderia ser feito a não ser esperar a morte. No entanto, a lepra não havia destruído a razão desses homens. Eles pensaram de maneira lógica e resolveram arriscar suas vidas em busca de uma solução prática para sua fome. Foram até o arraial dos sírios, e, para surpresa deles, ao chegarem perto do arraial, descobriram que estava desabitado, cheio de alimentos e riqueza, ficaram atônitos diante disso, pois, não sabiam da intervenção sobrenatural de Deus (2Rs 7.3-5).
Eles entraram, se alimentaram, se apropriaram de ouro, prata, vestes, bens inimagináveis e talvez jamais vistos. Estavam satisfeitos e felizes, mas, caíram em si, e lembraram-se dos seus irmãos, que estavam nas mesmas condições que eles e morreriam de fome, caso eles ocultassem essa boa-nova (2Rs 7.9).
Eles poderiam ter agido de forma vingativa, por serem tratados com discriminação e desprezo, diante da enfermidade e fragilidade em que se encontravam, mas, de uma forma admirável, mais uma vez a razão predominou e aqueles homens vencendo o medo, a limitação dos seus corpos, a solidão, a estigmatização, a culpa, a segregação e a impotência, chegaram perto dos muros da cidade, correndo risco de apedrejamento, para anunciar o segredo que haviam descoberto:” […] Fomos ao acampamento dos sírios e não havia ninguém lá, nem voz de homem, mas só os cavalos e os jumentos atados, e as tendas como estavam” (2Rs 7.10)
A solução para o problema da morte e da fome veio por parte de Deus, que confundiu os sírios, mas, o anúncio dessa boa-nova veio dos improváveis.
Deus, mais uma vez, mostrando que é o Senhor da história, Aquele que detém o controle de tudo e que age através dos loucos, como nos diz Paulo em 1Co 1.28,29: “Ele escolheu as coisas insignificantes do mundo, as desprezadas e as que são nada para reduzir a nada as que são, para que nenhum mortal se glorie na presença de Deus”.
Esses homens não lamentaram sua situação, não agiram com pessimismo ou derrotismo, não murmuraram, não olharam para sua fragilidade, nem tampouco foram tomados por espírito de vingança, eles foram nobres e empáticos para com aqueles que os desprezavam e conseguiram com o auxílio de Deus, trazer não só o alimento para o seu povo, mas a vitória sobre a guerra.
Ah! E quanto a profecia anunciada por Eliseu, ela se cumpriu e o capitão que duvidou da providência de Deus, viu os alimentos, mas, foi pisoteado na entrada dos portões e morreu sem comê-los (2Rs 7.19-20).
Que Deus em sua infinita sabedoria, possa conduzir o seu povo a uma conscientização diante das enfermidades e deficiências e que possamos olhar para os mesmos além da sua deficiência, possamos vê-los como pessoas capazes e aptas para desenvolver funções dentro das suas possibilidades, pois as deficiências não definem as pessoas.