Marcos 10.46-52
Conhecer sua realidade e a realidade do mundo que o cerca é muito importante para um cego, pois ajuda-o a entender um mundo que foi projetado por e para pessoas que enxergam. Perceber os obstáculos que o impedem de viver uma vida com dignidade, num mundo que foi planejado por videntes para suprir suas próprias necessidades, sem, contudo, perceber o outro, demonstra que a visão é essencial na percepção dos videntes, no entanto, quando o vidente tenta entender a visão de mundo de um cego cujo tudo ao seu redor foi criado por videntes, isso causa uma distorção no entendimento e segundo Nunes e Lomônaco (2010), esse lugar ocupado pela visão reduz
“[…] as possibilidades de entender o cego como ele realmente é, enfatiza suas limitações e não suas possibilidades. E isso, em um mundo de videntes, faz com que o deficiente visual seja ainda mais prejudicado (p. 61).
Se voltarmos aos tempos bíblicos, onde a cegueira era vista como consequência do pecado, a situação piora, pois o cego era visto como uma pessoa que não poderia desenvolver nenhuma atividade econômica para suprir suas necessidades e estava condenado a uma vida de mendicância. No caso do cego em questão, podemos ver alguém à frente do seu tempo, pois não se deixou intimidar por aqueles que estavam ao seu redor e ousou ser ouvido. Vamos analisar as atitudes do cego Bartimeu diante da possibilidade de cura:
- Ele ouviu, já que não via (v. 47; 2Co 4.4).
Ele ouviu dizer que Jesus estava passando por ali, e como sua audição era aguçada, em decorrência da sua deficiência visual, conheceu a voz de Jesus quando esse passava seguido por uma grande multidão. A cegueira de Bartimeu era física e não espiritual, então, ele… - Clamou, demonstrando fé (v. 47 e Rm 10.13).
Clamou por Aquele que poderia resolver seu problema, usando uma expressão – “Jesus, Filho de Davi” – que até o levaria a ser questionado pelos Doutores da Lei por atribuir a Jesus, o título de Messias, no entanto ele o fez por acreditar não apenas em milagres, mas n’Aquele que tem o poder para realizar milagres. - Ele não se intimidou, nem se vitimizou, diante das repreensões da multidão impiedosa e sem empatia que queria impedi-lo de se achegar a Jesus (v. 48).
- Ele conhecia sua realidade tanto física quanto espiritual e sabia que não merecia, mas, percebendo sua miséria, clamou por misericórdia e clamava cada vez mais alto para se fazer ouvir (v. 48).
- Mesmo diante das dificuldades, ele teve bom ânimo e atendeu ao chamado de Jesus (v. 49; Lc 15.20).
Diferente do jovem rico que rejeitou a Jesus (Mt 19.16-30), Bartimeu, levantou-se deu um salto e abandonou seu único bem, uma capa que o protegia do frio das noites passadas ao relento, e do sol escaldante do dia ao mendigar a beira da estrada, e indo a Jesus, expôs sua necessidade. - Conhecendo sua necessidade, Bartimeu, pediu só o necessário, diante da pergunta de Jesus: “o que queres que eu te faça?” Contrariamente a atitude dos discípulos Tiago e João em Marcos 10.36, que pediram posição e glória, não sabendo eles que quem ocuparia a esquerda e direita de Jesus em sua glória, seriam os ladrões da cruz no triunfo da crucificação de Cristo (Mc 15.27).
- Bartimeu, foi buscar cura física e ganhou um presente ainda maior, teve seus pecados perdoados e ganhou a vida eterna (v. 52). Jesus, que sonda os corações e sabia o tamanho da fé de Bartimeu e onde estava posto o seu coração – Filho de Davi – deu-lhe a cura física, a vida eterna e o mandou seguir o seu caminho.
Eis aí um cego à frente do seu tempo, que não se intimidou, não se apequenou devido a sua deficiência física, mas usou a sua necessidade para se fazer ouvir.
Que outros Bartimeus se levantem e mostrem ao mundo quais são as suas necessidades.
Bibliografia
NUNES, Sylvia; LOMÔNACO, José Fernando Bitencourt. O aluno cego; Preconceitos e potencialidades. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, SP. Volume 14, Número 1, janeiro/junho de 2010. P. 61